21 de maio de 2007
Explosão do paiol de Malhazine em Maputo
Foi na tarde do dia 22 de Março por volta das 6.30 que começou-se ouvir estrondo deste longe. Cada irmã estava quieta no seu quarto aproveitando o tempo para fazer os seus trabalhos.
Mas minutos depois nos demos conta que a explosão de paiol era algo muito sério. Cada irmã foi saindo do seu quarto e nos juntamos na varanda, minutos depois aparecem as voluntárias assustadas e cheias de medo. Até que uma delas dizia porque não vamos a cidade?
Enquanto estávamos na varanda via se a população estava todas cheia de medo, as crianças que viam da escola e quando se ouvia do barulho dos obuses que tinham o som de um avião que passava, nos juntávamos num único sitio.
Horas depois alguns obuses caíram nas casa vizinhas deixando uma nuvem de fumo preto.
O medo era manifestado de diferentes maneira algumas queriam comunicar mandando mensagem, outras telefonavam e outras estavam com o rádio aberto para acompanharem as recomendações do ministro da defesa nacional onde este parecia que não tinha muito a dizer ao seu povo alguns diziam abram as janelas e as portas para que as janelas não possam partir, e ele dizia “fechem as janelas, as portas e permaneçam dentro das casas ninguém sai.
Assim que o dia 22 de Março ficou como o dia que marcou cada pessoas que viveu está situação, isto que cada estrondo ou barulho que se faz sentir as pessoas se assustam pensando que é o paiol a explodir.
R.M.
Voluntariado ... por quê?
"O facto ou a razão mais significativa de fazer este voluntariado foi, sem duvida é querer ajudar as pessoas, querer fazer algo para melhorar a sua condição de vida e torna-las mais felizes… mas se fosse apenas essa a razão, porque ir para tão longe quando vivo num país que tem ainda tantas necessidades e tanta gente que vive sem as condições necessárias a uma vida dita condigna?
Penso que aqui pesaram vários factores… o querer conhecer outra realidade foi com certeza o mais determinante, vimos na televisão imagens que nos abalam muito, são realidades para nos chocantes…perguntamo-nos “como é possível? Mas continuamos com as nossas vidas e passado um minuto praticamente já não nos lembramos … e continuamos a viver numa realidade paralela, parece que aquelas imagens são algo semelhante a um filme do qual não fazemos parte.
Como ser humano acredito que assim não é, acredito que todos juntos temos que lutar por um mundo melhor e que se existem tantas pessoas a viver nessas condições cabe-nos a todos e principalmente aos países ditos desenvolvidos integrar essa realidade e procurar posteriormente alterá-la.
De um outro ponto de vista sei também que me dispus a fazer este voluntariado e encaro-o como uma experiência muito enriquecedora para mim própria; dando-me uma oportunidade extremamente rica a nível de desenvolvimento pessoal e profissional”
Bárbara
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Este projecto de fazer voluntariado em Moçambique, já vem a ser sonhado desde há algum tempo, tornando-se realidade agora!
As minhas motivaçoes para ir em missão sao a vontade absoluta e verdadeira de ajudar, de poder contribuir, um pouco que seja, para melhorar a qualidade de vida daquelas pessoas. Acho que as minhas motivaçoes podem se resumir num único e importante sentimentos: O amor ao próximo!
Diana
As minhas motivaçoes para ir em missão sao a vontade absoluta e verdadeira de ajudar, de poder contribuir, um pouco que seja, para melhorar a qualidade de vida daquelas pessoas. Acho que as minhas motivaçoes podem se resumir num único e importante sentimentos: O amor ao próximo!
Diana
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“As motivaçoes essas são muitas, o que para mim é importante realçar é a necessidade de ter consciência de que se vai para uma realidade diferente o que faz com que tenhamos que ter um espírito aberto para aprender de forma a proporcionar o “dar de não” sem esperara nada em troca.
Assim sendo o mais importante é o amor, que é universal e incondicional o que nos leva/motiva a ir ao encontro dos outros….
E quando há vontade meio caminho já está percorrido e como diz a música: A culpa é da vontade…, que me faz acreditar”
Marta
Assim sendo o mais importante é o amor, que é universal e incondicional o que nos leva/motiva a ir ao encontro dos outros….
E quando há vontade meio caminho já está percorrido e como diz a música: A culpa é da vontade…, que me faz acreditar”
Marta
A pandemia do HIV/SIDA em Africa
A situação na Africa é mais que dramática, vivemos tempos desconcertantes como diz o teólogo africano Benezet “Africa tornou-se o deposito do vírus do SIDA.
Apesar de ser um continente esquecido em matéria económica e nas grandes questões que presidem os destinos da humanidade, é celebre nas suas desgraças. Ante esta desgraça o continente está indefeso. A Igreja de Africa luta em vão para ajudar a população a sair desta situação catastrófica em que está submetida”.
Apesar de ser um continente esquecido em matéria económica e nas grandes questões que presidem os destinos da humanidade, é celebre nas suas desgraças. Ante esta desgraça o continente está indefeso. A Igreja de Africa luta em vão para ajudar a população a sair desta situação catastrófica em que está submetida”.
É verdade, todo o Continente está indefeso, Moçambique está indefeso ante esta catástrofe humanitária sem limites, possivelmente a maior catástrofe da história da humanidade.
É difícil conhecer os dados reais em concreto em Moçambique.
Em Novembro de 2004, já faz 2 anos afirmava-se que a esperança de vida tenha diminuido dos 46,4 para os 38,1 anos de vida em consequência do SIDA e se estimava que no ano 2010 ainda baixaria para... 35,9 anos. O número de infectados continua aumentando. Se diz que só estamos a ver as orelhas do hipopótamo ou os olhos do crocodilo.
Mas hoje não estou aqui para trazer números e percentagens, todos somos conscientes que a situação é trágica e que as estatísticas estão a alcançar cifras verdadeiramente arrepiantes.
Detrás das frias estatísticas, todos o sentimos, há seres humanos, pessoas de carne e osso cujas vidas ficam truncadas sem esperança de poder continuar a viver.
É por isso que hoje trago diante de vocês, rostos e nomes concretos: João, Cecília, Alberto, Maria... assim até chegar aos 7000 doentes que atendemos no Centro de Saúde e também os nomes de tantos outros que não têm a oportunidade de apresentar a ninguém o seu problema pois lhe tem sido negada a voz.
Muitos dos nossos irmãos doentes, em todo o Moçambique, não têm dinheiro, nem trabalho, não têm estudos, nem títulos, nem consciência da sua dignidade.
Não tem voz nem sabem como fazer-se ouvir.
Nem sequer têm beleza física, pelo contrário, muitos não têm sequer aparência humana, como se diz do servo sofredor que o seu aspecto não era atractivo como alguém a que não se quer olhar.Muitos dos nossos irmãos estão a ser rejeitados e desprezados.
E o pior é que não são estimados em nada, não interessam, não existem, para o mundo é como se estivessem mortos.
Contudo, estes nossos irmãos têm um nome, uma família e uma história.
Têm uma condição pessoal única e irrepetível.
Têm alma e têm Fé e sobretudo gozam da maior dignidade aos olhos de Deus pois são os seus predilectos.
Mas para descobrir esta riqueza precisamos dum encontro não só informativo senão afectivo. Por rostos e nomes, entrar no mundo das relações, da gratuidade e da reciprocidade.
A partir de aí, tudo muda radicalmente, podemos dizer que há um antes e um depois deste encontro. Passamos não só a implicarmo-nos como também a complicarmo-nos, e bem que nos complicamos a vida, já que nos fazemos responsáveis do que agora conhecemos.
Acredito firmemente que o encontro pessoal é indispensável. E já não se precisa dedicar-se à saúde para encontrar-se com enfermos de SIDA, são os nossos professores, os nossos vizinhos, os nossos familiares, os nossos paroquianos.... Eu pessoalmente sinto-me privilegiada, e falo desde o mais profundo do meu coração, pelo lugar que me correspondeu nesta luta: acompanhar de perto e partilhar com o nosso povo muita dor, é verdade, mas também muita esperança e muita Vida.
Não temos outro caminho, não existem corta-matos do contrário ¿como amar aquilo que não se conhece? Se não vivemos esta experiência do encontro pessoal, esta luta contra o SIDA não nos vai cativar o coração, não nos vai apaixonar. E só o que nos cativa o coração é o que nos faz mover para encontrar soluções.
Hoje, mais que nunca, se pede de nós que não percamos a esperança, uma esperança contra toda aparência, contra todos os prognósticos, contra todas as probabilidades, uma esperança no Deus que ressuscita aos mortos.
Pois a força com que se impõe esta situação, não chega a escurecer os sinais de esperança. Cada dia, somos testemunhas de verdadeiros milagres, milagres de esperança, que nos dão a coragem para não desanimar.
São os milagres da resistência humana, da solidariedade, do trabalho em equipa... e tudo isto nos ajuda a crer que é possível transformar a realidade, ainda nas piores circunstâncias.
Queridos amigos vamos a apostar pela vida daqueles que para o mundo já estão mortos, como Jesus que lhes trouxe um novo impulso, restituiu a sua dignidade e lhes deu a certeza de ter uma dignidade indestrutível aos olhos de Deus.
Escutar a dor dos nossos irmãos, partilhar as suas esperanças, comunicar-lhes que existem sonhos que merecem ser sonhados e realidades que devem ser transformadas.
O futuro de Moçambique está em perigo, de facto a luta só acaba de começar ¿Como vamos a vacilar precisamente no momento mais decisivo?
Como diz Deuteronomio 20,3: Escuta Israel, agora que estais a ponto de travar combate, que o vosso coração não falhe, não tenhais medo nem angústia.
Aqueles que acreditamos na utopia cristã e na força transformadora do amor, estamos convencidos desde o mais profundo do nosso ser, que a morte não tem a última palavra e que Deus vai escutar o clamor do seu povo.
R.G.
Assim vivi eu o passo do ciclone Favio
Em poucas palavras quero partilhar o que ouvimos, vimos e sentimos.
Como sabeis estamos na Província de Inhambane a 360 Km da capital provincial, na Vila de Inhassoro que fica situada à beira mar no norte da Província.
O seu clima é quente e húmido, com frequência sopram os ventos norte e sul denominado pelo povo “mau tempo”. Desde o ano 2002 foi classificada esta zona como zona ciclónica.
Desta vez, o aviso passou 15 dias antes. Toda a população foi avisada de que haveria um ciclone muito forte de categoria 4, denominado Fávio. Uns acreditaram outros duvidaram porque no ano passado também se deu um aviso de ciclone e depois não houve e segundo os meteorologistas, o dito ciclone tinha sido transformado “em mau tempo”. Neste ano foi bem diferente, verdadeiro e estranho.
Foi estranho porque faltando dois dias, assistimos na vila a um movimento de saída dos turistas da zona e de todos os estrangeiros. A empresa que está a explorar o gás, e os que estão a pesquisar o petróleo, abandonaram o serviço com a permissão dos respectivos Chefes, para assim poderem estar nas províncias mais seguras, como é o caso de Maputo, a capital do país, e noutros países vizinhos.
Na paróquia na qual estamos inseridas, estava-se a preparar a cerimónia do lançamento da primeira pedra da Igreja, porque nesta zona só existem capelas construídas em material local. Tudo estava pronto. Os convites lançados, as capulanas e camisetas preparadas para ser vestidas e a cerimónia organizada. Nos convites estavam incluídos os Bispos da diocese da Itália aonde pertence o pároco e o da diocese de Inhambane, Dom Adriano, diocese á qual pertencemos.
A verdade é que o ciclone começou a fazer-se sentir a partir do dia 21 de Fevereiro pelas 22:00H mas só começou a aumentar a sua força a partir das 10:00 do dia 22 até às 14:00, em que amainou durante por um espaço de 30 minutos, passados os quais, recomeçaram com uma violência maior até às 17:00H. Foi um tempo longo e difícil de viver. O forte vento vinha acompanhado de chuvas e faíscas.
Durante o ciclone, nós as 4 irmãs e as nossas 4 jovens aspirantes, ficamos dentro de casa com as portas e janelas fechadas, tal como estava recomendado no alerta vermelha. No começo passeávamos por toda a casa para observar o espetáculo lá fora. A visão não era clara porque o vento arrastava muito lixo e poeira que impediam a boa visão.
O primeiro estrago que vimos, foi o corte dos fios do telefone e electricidade; em seguida vimos que na casa da nossa vizinha as chapas estavam todas levantadas e, ela com os seus filhos - arriscando a vida para salvar a vida – enchiam sacos de areia que a todo o custo colocavam sobre o telhado. Cena triste e penosa. A seguir foi a tampa do tanque de água no quintal da nossa casa que se abria e fechava...passados alguns minutos já não se encontrava o tanque nem a torre sobre a qual estava colocado. Desta maneira assistimos a muitas coisas que caiam e desapareciam.
Passado algum tempo, cortou-se toda a comunicação e a energia, e não conseguíamos mover-nos muito, não por falta de espaço, mas porque nos joelhos já não tínhamos forças, os ouvidos doíam e o medo começou a dominar-nos.
Pensamos dividir-nos para que cada uma pudesse ficar por baixo de um aro de alguma das portas, experimentámos, mas logo regressámos ao mesmo lugar, para estarmos juntas e nos protegermos umas ás outras. A casa parecia que abanava toda. Por fim, Ir. Idalina descobriu que na capelinha havia um tecto de cimento num cantinho, chamou-nos a todas para nos apertarmos naquele lugar porque não cabíamos de outra forma. Ficamos abraçadas e cada uma procurava proteger a cabeça. Como a situação se agravava sempre mais, as manas aspirantes começaram a chorar e ficaram cansadas de estar de pé...Sentaram-se mas como sentadas ocupavam muito espaço, procurámos um banquinho estreito onde nos podíamos sentar “por turnos” e assim descansar um poucoa tensão que sentíamos nas pernas e em todo o corpo...Dos olhos de algumas corriam as lágrimas em silêncio e mesmo vendo-o, ninguém perguntava à outra o motivo do choro porque tudo estava claro...era o Fávio! No meio de um suspiro alguém disse: “O ciclone acertou na hora de chegar, depois do almoço, porque assim tínhamos forças para agüentar”...O humor é a última coisa a morrer!!!
Mas logo aparecia aquela força imparável do vento que nos dominava... Começamos a rezar...algumas não tinham vontade de responder porque não conseguiam articular palavra, mas quando soprou com mais violência, todas decidimos rezar com voz forte, cantámos a Salvé e embora as vozes tremessem, mesmo assim chegamos até ao fim.
Passadas quase 5 horas de nos mantermos abraçadas, o vento amainou, e foi então que nos espalhamos para ver o que tinha acontecido em volta de nós. Afinal a casa tinha perdido as chapas da cobertura, as peças do tecto falso, umas caídas, outras dependuradas com os suportes metálicos todos torcidos, outras completamente a desfazer-se porque tinham apanhado a chuva, e finalmente fomos avisadas pelos nossos vizinhos que o tanque de água de 3.000 litros tinha voado para mais de 500metros, atravessando a nossa rua!!! Eles tinham-no visto voar e nos indicaram a direcção: Foi a muito custo que todas juntas o conseguimos empurrar para casa. Quando saímos à rua encontramos as pessoas a chorar pela perda de suas casas e haveres, das suas árvores de fruto, seus coqueiros e mafurreiras destruídas e arrancadas de raíz....Impressionava, é como se alguém as tivesse querido asssassinar...
Chegámos à missão onde está a residência do Padre, vimos tudo descoberto e o padre com os seus hóspedes molhados e sem espaço para sequer se sentarem.
Sentimos uma profunda tristeza ao contemplar tanta destruição, escolas, o hospital, as poucas lojas e as casinhas pobres, toda a riqueza do nosso povo, completamente destruídas! Era a desolação mais completa!...
A nível de mortalidade, por ter acontecido durante o dia e pelo aviso todas as escolas estavam fechadas e ninguém saíu para o trabalho, graças a Deus só lamentamos na Vila, em Inhassoro, duas mortes: uma criança que estava a dormir e ficou esmagada debaixo da parede da casa que derrubou , e a outra foi um adulto que vendo a sua casa a cair se refugiou numa capela vizinha, que lhe caiu em cima ficando soterrado igualmente debaixo dela.
Mas o nosso povo está habituado ao sofrimento. Tem de lutar diariamente para vencer os revezes da vida, por isso não se deixa vencer facilmente. Era só ver...No dia seguinte ao ciclone, todas as famílias pegaram nos instrumentos para começar a limpeza e a reconstrução das casas, lojas, bancas e armazéns. Por todos os lados se ouvia bater latas ou cortes nas árvores caídas.
Na Missão os cristãos espontaneamente se juntaram com os seus instrumentos, a retirar chapas torcidas, ferros, árvores, enfim a limpar como se podia o espaço em frente da Missão...O tempo não favorecia muito porque a chuva continuava e o vento voltou a assustar-nos pela sua intensidade, até chegaram algumas notícias dizendo que outro ciclone se estava a formar na Ilha de Madagáscar...Graças a Deus, que se desfez antes...Já chegava com o “nosso Fávio”!!!
Irmãs tudo passou...Muito haveria para partilhar acerca do sofrimento do povo, da sua luta para reconstruir a sua casinha, durará muito até que consigam arranjar dinheiro para comprar as chapas, os pregos, os barrotes, a porta...Alguns com os restos de chapas que voaram para o seu quintal colocaram assim mesmo em cima da casa para se cobrirem...A maioria não tiveram tal “sorte” por isso só ouvíamos as mamãs a dizer quando as cumprimentávamos: “estamos bem só as crianças estão constipadas, com muita tosse, diarreia, malária...”Com a chuva e o vento que se faiam sentir não era de estranhar a doença..
Agora fica-nos, também a nós, o trabalho de reconstrução.
Mas nós sentimo-nos das “bem-aventuradas” porque logo no sábado, dia da nossa Madre Fundadora, chegou a 1ª Visita: A Ir. Teresa! Logo depois a Ir. Inocência vinda de Quelimane e as nossas manas Fátima e Regina poucos dias depois.
Sentimos um encorajamento muito grande Irmãs, também por todos os sinais de solidariedade que nos fizestes chegar, pela vossa oração que sentimos em cada momento. Até chegávamos a dizer: “É por pela oração e presença tão sensível das irmãs que nós nos sentimos tão fortes!”
Obrigada Irmãs todas da Vigararia, da Província e da Casa Geral. Obrigado pela vossa solidariedade e presença fraterna e amiga.
Sentimos, como dizia a nossa madre Fundadora: “O sofrer passa, mas a experiência de ter sofrido, não passará jamais”. Este foi um acontecimento em que sentimos de uma forma especial como Deus está presente na nossa vida.
Obrigada a todas!
A.A.
Inhassoro, Fevereiro 2007
Como sabeis estamos na Província de Inhambane a 360 Km da capital provincial, na Vila de Inhassoro que fica situada à beira mar no norte da Província.
O seu clima é quente e húmido, com frequência sopram os ventos norte e sul denominado pelo povo “mau tempo”. Desde o ano 2002 foi classificada esta zona como zona ciclónica.
Desta vez, o aviso passou 15 dias antes. Toda a população foi avisada de que haveria um ciclone muito forte de categoria 4, denominado Fávio. Uns acreditaram outros duvidaram porque no ano passado também se deu um aviso de ciclone e depois não houve e segundo os meteorologistas, o dito ciclone tinha sido transformado “em mau tempo”. Neste ano foi bem diferente, verdadeiro e estranho.
Foi estranho porque faltando dois dias, assistimos na vila a um movimento de saída dos turistas da zona e de todos os estrangeiros. A empresa que está a explorar o gás, e os que estão a pesquisar o petróleo, abandonaram o serviço com a permissão dos respectivos Chefes, para assim poderem estar nas províncias mais seguras, como é o caso de Maputo, a capital do país, e noutros países vizinhos.
Na paróquia na qual estamos inseridas, estava-se a preparar a cerimónia do lançamento da primeira pedra da Igreja, porque nesta zona só existem capelas construídas em material local. Tudo estava pronto. Os convites lançados, as capulanas e camisetas preparadas para ser vestidas e a cerimónia organizada. Nos convites estavam incluídos os Bispos da diocese da Itália aonde pertence o pároco e o da diocese de Inhambane, Dom Adriano, diocese á qual pertencemos.
A verdade é que o ciclone começou a fazer-se sentir a partir do dia 21 de Fevereiro pelas 22:00H mas só começou a aumentar a sua força a partir das 10:00 do dia 22 até às 14:00, em que amainou durante por um espaço de 30 minutos, passados os quais, recomeçaram com uma violência maior até às 17:00H. Foi um tempo longo e difícil de viver. O forte vento vinha acompanhado de chuvas e faíscas.
Durante o ciclone, nós as 4 irmãs e as nossas 4 jovens aspirantes, ficamos dentro de casa com as portas e janelas fechadas, tal como estava recomendado no alerta vermelha. No começo passeávamos por toda a casa para observar o espetáculo lá fora. A visão não era clara porque o vento arrastava muito lixo e poeira que impediam a boa visão.
O primeiro estrago que vimos, foi o corte dos fios do telefone e electricidade; em seguida vimos que na casa da nossa vizinha as chapas estavam todas levantadas e, ela com os seus filhos - arriscando a vida para salvar a vida – enchiam sacos de areia que a todo o custo colocavam sobre o telhado. Cena triste e penosa. A seguir foi a tampa do tanque de água no quintal da nossa casa que se abria e fechava...passados alguns minutos já não se encontrava o tanque nem a torre sobre a qual estava colocado. Desta maneira assistimos a muitas coisas que caiam e desapareciam.
Passado algum tempo, cortou-se toda a comunicação e a energia, e não conseguíamos mover-nos muito, não por falta de espaço, mas porque nos joelhos já não tínhamos forças, os ouvidos doíam e o medo começou a dominar-nos.
Pensamos dividir-nos para que cada uma pudesse ficar por baixo de um aro de alguma das portas, experimentámos, mas logo regressámos ao mesmo lugar, para estarmos juntas e nos protegermos umas ás outras. A casa parecia que abanava toda. Por fim, Ir. Idalina descobriu que na capelinha havia um tecto de cimento num cantinho, chamou-nos a todas para nos apertarmos naquele lugar porque não cabíamos de outra forma. Ficamos abraçadas e cada uma procurava proteger a cabeça. Como a situação se agravava sempre mais, as manas aspirantes começaram a chorar e ficaram cansadas de estar de pé...Sentaram-se mas como sentadas ocupavam muito espaço, procurámos um banquinho estreito onde nos podíamos sentar “por turnos” e assim descansar um poucoa tensão que sentíamos nas pernas e em todo o corpo...Dos olhos de algumas corriam as lágrimas em silêncio e mesmo vendo-o, ninguém perguntava à outra o motivo do choro porque tudo estava claro...era o Fávio! No meio de um suspiro alguém disse: “O ciclone acertou na hora de chegar, depois do almoço, porque assim tínhamos forças para agüentar”...O humor é a última coisa a morrer!!!
Mas logo aparecia aquela força imparável do vento que nos dominava... Começamos a rezar...algumas não tinham vontade de responder porque não conseguiam articular palavra, mas quando soprou com mais violência, todas decidimos rezar com voz forte, cantámos a Salvé e embora as vozes tremessem, mesmo assim chegamos até ao fim.
Passadas quase 5 horas de nos mantermos abraçadas, o vento amainou, e foi então que nos espalhamos para ver o que tinha acontecido em volta de nós. Afinal a casa tinha perdido as chapas da cobertura, as peças do tecto falso, umas caídas, outras dependuradas com os suportes metálicos todos torcidos, outras completamente a desfazer-se porque tinham apanhado a chuva, e finalmente fomos avisadas pelos nossos vizinhos que o tanque de água de 3.000 litros tinha voado para mais de 500metros, atravessando a nossa rua!!! Eles tinham-no visto voar e nos indicaram a direcção: Foi a muito custo que todas juntas o conseguimos empurrar para casa. Quando saímos à rua encontramos as pessoas a chorar pela perda de suas casas e haveres, das suas árvores de fruto, seus coqueiros e mafurreiras destruídas e arrancadas de raíz....Impressionava, é como se alguém as tivesse querido asssassinar...
Chegámos à missão onde está a residência do Padre, vimos tudo descoberto e o padre com os seus hóspedes molhados e sem espaço para sequer se sentarem.
Sentimos uma profunda tristeza ao contemplar tanta destruição, escolas, o hospital, as poucas lojas e as casinhas pobres, toda a riqueza do nosso povo, completamente destruídas! Era a desolação mais completa!...
A nível de mortalidade, por ter acontecido durante o dia e pelo aviso todas as escolas estavam fechadas e ninguém saíu para o trabalho, graças a Deus só lamentamos na Vila, em Inhassoro, duas mortes: uma criança que estava a dormir e ficou esmagada debaixo da parede da casa que derrubou , e a outra foi um adulto que vendo a sua casa a cair se refugiou numa capela vizinha, que lhe caiu em cima ficando soterrado igualmente debaixo dela.
Mas o nosso povo está habituado ao sofrimento. Tem de lutar diariamente para vencer os revezes da vida, por isso não se deixa vencer facilmente. Era só ver...No dia seguinte ao ciclone, todas as famílias pegaram nos instrumentos para começar a limpeza e a reconstrução das casas, lojas, bancas e armazéns. Por todos os lados se ouvia bater latas ou cortes nas árvores caídas.
Na Missão os cristãos espontaneamente se juntaram com os seus instrumentos, a retirar chapas torcidas, ferros, árvores, enfim a limpar como se podia o espaço em frente da Missão...O tempo não favorecia muito porque a chuva continuava e o vento voltou a assustar-nos pela sua intensidade, até chegaram algumas notícias dizendo que outro ciclone se estava a formar na Ilha de Madagáscar...Graças a Deus, que se desfez antes...Já chegava com o “nosso Fávio”!!!
Irmãs tudo passou...Muito haveria para partilhar acerca do sofrimento do povo, da sua luta para reconstruir a sua casinha, durará muito até que consigam arranjar dinheiro para comprar as chapas, os pregos, os barrotes, a porta...Alguns com os restos de chapas que voaram para o seu quintal colocaram assim mesmo em cima da casa para se cobrirem...A maioria não tiveram tal “sorte” por isso só ouvíamos as mamãs a dizer quando as cumprimentávamos: “estamos bem só as crianças estão constipadas, com muita tosse, diarreia, malária...”Com a chuva e o vento que se faiam sentir não era de estranhar a doença..
Agora fica-nos, também a nós, o trabalho de reconstrução.
Mas nós sentimo-nos das “bem-aventuradas” porque logo no sábado, dia da nossa Madre Fundadora, chegou a 1ª Visita: A Ir. Teresa! Logo depois a Ir. Inocência vinda de Quelimane e as nossas manas Fátima e Regina poucos dias depois.
Sentimos um encorajamento muito grande Irmãs, também por todos os sinais de solidariedade que nos fizestes chegar, pela vossa oração que sentimos em cada momento. Até chegávamos a dizer: “É por pela oração e presença tão sensível das irmãs que nós nos sentimos tão fortes!”
Obrigada Irmãs todas da Vigararia, da Província e da Casa Geral. Obrigado pela vossa solidariedade e presença fraterna e amiga.
Sentimos, como dizia a nossa madre Fundadora: “O sofrer passa, mas a experiência de ter sofrido, não passará jamais”. Este foi um acontecimento em que sentimos de uma forma especial como Deus está presente na nossa vida.
Obrigada a todas!
A.A.
Inhassoro, Fevereiro 2007
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