21 de maio de 2007

A pandemia do HIV/SIDA em Africa




A situação na Africa é mais que dramática, vivemos tempos desconcertantes como diz o teólogo africano Benezet “Africa tornou-se o deposito do vírus do SIDA.
Apesar de ser um continente esquecido em matéria económica e nas grandes questões que presidem os destinos da humanidade, é celebre nas suas desgraças. Ante esta desgraça o continente está indefeso. A Igreja de Africa luta em vão para ajudar a população a sair desta situação catastrófica em que está submetida”.



É verdade, todo o Continente está indefeso, Moçambique está indefeso ante esta catástrofe humanitária sem limites, possivelmente a maior catástrofe da história da humanidade.
É difícil conhecer os dados reais em concreto em Moçambique.



Em Novembro de 2004, já faz 2 anos afirmava-se que a esperança de vida tenha diminuido dos 46,4 para os 38,1 anos de vida em consequência do SIDA e se estimava que no ano 2010 ainda baixaria para... 35,9 anos. O número de infectados continua aumentando. Se diz que só estamos a ver as orelhas do hipopótamo ou os olhos do crocodilo.



Mas hoje não estou aqui para trazer números e percentagens, todos somos conscientes que a situação é trágica e que as estatísticas estão a alcançar cifras verdadeiramente arrepiantes.
Detrás das frias estatísticas, todos o sentimos, há seres humanos, pessoas de carne e osso cujas vidas ficam truncadas sem esperança de poder continuar a viver.



É por isso que hoje trago diante de vocês, rostos e nomes concretos: João, Cecília, Alberto, Maria... assim até chegar aos 7000 doentes que atendemos no Centro de Saúde e também os nomes de tantos outros que não têm a oportunidade de apresentar a ninguém o seu problema pois lhe tem sido negada a voz.



Muitos dos nossos irmãos doentes, em todo o Moçambique, não têm dinheiro, nem trabalho, não têm estudos, nem títulos, nem consciência da sua dignidade.
Não tem voz nem sabem como fazer-se ouvir.



Nem sequer têm beleza física, pelo contrário, muitos não têm sequer aparência humana, como se diz do servo sofredor que o seu aspecto não era atractivo como alguém a que não se quer olhar.Muitos dos nossos irmãos estão a ser rejeitados e desprezados.
E o pior é que não são estimados em nada, não interessam, não existem, para o mundo é como se estivessem mortos.



Contudo, estes nossos irmãos têm um nome, uma família e uma história.
Têm uma condição pessoal única e irrepetível.
Têm alma e têm Fé e sobretudo gozam da maior dignidade aos olhos de Deus pois são os seus predilectos.

Mas para descobrir esta riqueza precisamos dum encontro não só informativo senão afectivo. Por rostos e nomes, entrar no mundo das relações, da gratuidade e da reciprocidade.
A partir de aí, tudo muda radicalmente, podemos dizer que há um antes e um depois deste encontro. Passamos não só a implicarmo-nos como também a complicarmo-nos, e bem que nos complicamos a vida, já que nos fazemos responsáveis do que agora conhecemos.



Acredito firmemente que o encontro pessoal é indispensável. E já não se precisa dedicar-se à saúde para encontrar-se com enfermos de SIDA, são os nossos professores, os nossos vizinhos, os nossos familiares, os nossos paroquianos.... Eu pessoalmente sinto-me privilegiada, e falo desde o mais profundo do meu coração, pelo lugar que me correspondeu nesta luta: acompanhar de perto e partilhar com o nosso povo muita dor, é verdade, mas também muita esperança e muita Vida.



Não temos outro caminho, não existem corta-matos do contrário ¿como amar aquilo que não se conhece? Se não vivemos esta experiência do encontro pessoal, esta luta contra o SIDA não nos vai cativar o coração, não nos vai apaixonar. E só o que nos cativa o coração é o que nos faz mover para encontrar soluções.

Hoje, mais que nunca, se pede de nós que não percamos a esperança, uma esperança contra toda aparência, contra todos os prognósticos, contra todas as probabilidades, uma esperança no Deus que ressuscita aos mortos.
Pois a força com que se impõe esta situação, não chega a escurecer os sinais de esperança. Cada dia, somos testemunhas de verdadeiros milagres, milagres de esperança, que nos dão a coragem para não desanimar.



São os milagres da resistência humana, da solidariedade, do trabalho em equipa... e tudo isto nos ajuda a crer que é possível transformar a realidade, ainda nas piores circunstâncias.
Queridos amigos vamos a apostar pela vida daqueles que para o mundo já estão mortos, como Jesus que lhes trouxe um novo impulso, restituiu a sua dignidade e lhes deu a certeza de ter uma dignidade indestrutível aos olhos de Deus.



Escutar a dor dos nossos irmãos, partilhar as suas esperanças, comunicar-lhes que existem sonhos que merecem ser sonhados e realidades que devem ser transformadas.

O futuro de Moçambique está em perigo, de facto a luta só acaba de começar ¿Como vamos a vacilar precisamente no momento mais decisivo?
Como diz Deuteronomio 20,3: Escuta Israel, agora que estais a ponto de travar combate, que o vosso coração não falhe, não tenhais medo nem angústia.

Aqueles que acreditamos na utopia cristã
e na força transformadora do amor, estamos convencidos desde o mais profundo do nosso ser, que a morte não tem a última palavra e que Deus vai escutar o clamor do seu povo.
R.G.


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